sábado, 30 de junho de 2007

Simplicidade (VI)


Herbário no Gerês, 2007

"... A madeira é uma bela coisa para se pensar nela. Vem de uma árvore; e as árvores crescem, e nós não sabemos porque é que elas crescem. Crescem durante anos e anos, sem nos prestarem atenção, crescem nas colinas, nas florestas e à beira dos rios - tudo coisas em que é bom pensar. As vacas sacodem a cauda debaixo delas nas tardes quentes de Verão; e as suas folhas tornam os ribeiros tão verdes que se uma galinhola aparece agora, quase esperamos que as suas penas se tenham tornado verdes também. Gosto de pensar no peixe que balouça contra a corrente como as bandeiras tremulam ao vento; e nos insectos de água que abrem lentamente os seus túneis no fundo do regato. Gosto de pensar na própria árvore: primeiro na sensação abrigada e seca de ser madeira; depois na agitação das tempestades; depois no lento e delicioso escorrer interior da seiva. Gosto de imaginar também as noites de Inverno, ser então uma árvore de pé no campo raso cheio à volta de folhas desfeitas e caídas, sem nada em mim de vulnerável que receie expor-se aos raios de aço da lua, um mastro nu cravado na terra que treme e treme durante a noite inteira. O canto dos pássaros deve parecer muito cheio de força e estranho pelo mês de Junho; e os pés dos insectos devem sentir-se frios enquanto sobem penosamente pela casca rugosa e encontram as folhas verdes que rebentam e as olham com os seus olhos vermelhos marchetados como diamantes..."

Virginia Woolf, Contos (A Marca na parede, 1917)

Tradução de Miguel Serras Pereira

1 Comentários:

Anonymous Anónimo disse...

As coisas mais simples da vida, são, na minha opinião as mais belas e essenciais. Pois como se pode constatar no exemplo da árvore, ela sempre esteve cá, cresceu durante anos, nem nos apecebemos dela, mas ela, é uma das coisas mais essenciais para a nossa vida.

Sara Fonseca

15 de agosto de 2007 às 01:20  

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